quarta-feira, 1 de junho de 2016

Michel Temer quebra a autonomia da EBC

Por Iago Sarinho

Descrição para cegos: a imagem mostra o Diário Oficial da União com a Exoneração de Ricardo Melo do Cargo de Diretor Presidente da EBC circulada em vermelho.

Criada através do decreto nº 6.246 de 24 de outubro de 2007, a Empresa Brasileira de Comunicação (EBC) controla uma rede de emissoras de radiodifusão públicas e de caráter educativo. A EBC aglomera em sua estrutura e sob a sua responsabilidade, entre outros veículos, a TV Brasil, a Agência Brasil e a TV NBR.
O estatuto social da empresa, regulamentado pelo decreto nº 6.689 em dezembro de 2008, determina um mandato de quatro anos para o Diretor Presidente, designado pela Presidência da República. É fixo e não pode coincidir com o mandato presidencial, de modo que se possa preservar a estrutura e linhas editoriais da empresa e seus veículos de forma minimamente independente do comando central da república e de eventuais modificações oriundas de processos eleitorais.


A EBC ainda conta com um Conselho Curador enquanto órgão de controle social. Este, apesar de não nomear o comando da rede, pode indicar sua saída, além de ter importante papel na definição, tanto da linha editorial dos veículos, quanto nas definições estruturais e administrativas tomadas pela empresa.
Como uma das primeiras medidas adotadas pelo Presidente interino Michel Temer, Ricardo Melo, Diretor Presidente nomeado por Dilma Rousseff no dia 3 de maio de 2016 e com mandato vigente até 2020, foi exonerado do cargo e substituído por Laerte Rimoli, um dos coordenadores da campanha de Aécio Neves em 2014 e assessor da Câmara dos Deputados durante o mandato de Eduardo Cunha.
A medida adotada pelo Presidente interino, que vai de encontro ao estatuto da EBC e sua autonomia, foi contestada no STF no último dia 17, através de ação de Ricardo Melo, requerendo o cumprimento do estatuto social e a anulação do ato presidencial. A principal argumentação é de que a sua nomeação é um ato jurídico perfeito, um dos princípios básicos do sistema democrático. Ainda não houve posicionamento ou decisão do STF sobre o caso.
A ação de Michel Temer rapidamente ganhou repercussão e para além dos grupos que detém o monopólio da comunicação no país e que tinham na EBC um contraponto ao apresentar uma grade de programação divergente do modelo padrão da radiodifusão brasileira, vem sendo recebida de forma muito negativa por comunicadores, professores, estudantes e a sociedade civil organizada.
Em todas as regiões do país, foram e seguem sendo organizados atos contrários à medida do Presidente interino, canalizados pela página “Frente em defesa da EBC e da Comunicação Pública” na rede social Facebook. A página tem recebido o engajamento de diversos grupos e segmentos da sociedade que defendem uma comunicação pública, independente e plural.
Uma das atividades da frente, é um abaixo assinado virtual que já conta com mais de 10 mil assinaturas. O documento pode ser acessado e assinado através deste link (Abaixo assinado em defesa da EBC). 
Em mais um dos desdobramentos do caso, ao longo da semana passada, em informação veiculada em diversos meios de comunicação da Paraíba, foi divulgada uma articulação para a indicação, por intermédio do Senador paraibano Cássio Cunha Lima (PSDB), do radialista Fabiano Gomes para assumir uma das diretorias da empresa. Fabiano foi um dos coordenadores da campanha para o Governo da Paraíba, em 2014, do Senador tucano.
Assim como a exoneração de Ricardo Melo, a indicação de Fabiano Gomes gerou revolta em diversos segmentos da comunicação no estado e entre os movimentos sociais, já que ele, dentre outras atividades é apresentador de programas “policialescos” e conhecido no estado como um adversário da luta pela garantia dos direitos humanos.
Entre as principais reações, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado da Paraíba em conjunto com a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), lançaram nota de repúdio na qual criticam a indicação de Fabiano Gomes “por ele representar o que há de mais atrasado no rádio paraibano e por sua falta de compromisso com a ética e com os direitos humanos”.
Com a exoneração de Ricardo Melo e a possível nomeação de Fabiano Gomes, Temer e sua equipe demonstram que além de pouco democráticos, desconhecem a função social da comunicação pública e colocam em prática o que alegavam vir sendo feito pelo governo Dilma, o efetivo aparelhamento da empresa pública, objetivando transformá-la em uma mera propagadora do discurso do Governo Federal.
Caso o STF não derrube a medida que exonerou Ricardo Melo e contribua para o desmanche da EBC, já dá para imaginar um “Domingão do Faustão” no lugar de programas como o “Samba na Gamboa”.

Confira na íntegra a nota do Sindicato dos Jornalistas da Paraíba e da Fenaj em repúdio pela indicação de Fabiano Gomes para a EBC:

NOTA DE REPÚDIO AO GOVERNO GOLPISTA PELA INDICAÇÃO DE FABIANO GOMES À DIREÇÃO DA EBC

O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado da Paraíba e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) vêm a público manifestar seu repúdio à indicação do radialista Fabiano Gomes à Direção da Empresa Brasileira de Comunicação – EBC, tão importante para a sociedade, que tem como objetivo dar vez e voz à população e estimular a participação dos vários segmentos indiscriminadamente com vistas ao empoderamento social da comunicação pública pelas pessoas, por ele representar o que há de mais atrasado no rádio paraibano e por sua falta de compromisso com a ética e com os direitos humanos.

A nomeação do Sr. Fabiano Gomes à EBC consiste numa afronta à cidadania e ao povo paraibano, em especial às mulheres, que, em episódio não tão distante, já foram fortemente violentadas em seu programa de Rádio, com palavras ofensivas, demonstrando seu caráter preconceituoso e misógino.

Portanto o Sr. Fabiano Gomes não possui nenhum preparo profissional para assumir a direção de uma empresa pública da magnitude da EBC.

Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado da Paraíba
Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj)

João Pessoa, 30 de maio de 2016

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